Elenco do Flamengo acumula rusgas desde Jesus e entra em ebulição com Sousa; diretoria distante expõe guerra política




Espn: O elenco do Flamengo não fala a mesma língua do treinador. A frase é atual, de abril de 2022. Mas poderia ter sido usada no segundo semestre do ano mágico de 2019, durante a passagem de Domènec Torrent ou ao longo dos trabalhos de Rogério Ceni e Renato Gaúcho. Fato é que rusgas entre o estrelado grupo e o comandante de momento são frequentes desde a era Jorge Jesus.



Sob a batuta de Paulo Sousa, o enredo é o mesmo: um respeito inicial e a crença de que o trabalho que se iniciava poderia render frutos. No entanto, tropeços inesperados, uma desconfiança dos métodos utilizados e, por fim, um incômodo considerável com opções que desagradam lideranças do elenco.

Com pouco menos de três meses de trabalho, Paulo Sousa mantém a confiança em sua metodologia, mas ainda não sabe se terá tempo para colher frutos da mesma. A perda do título estadual para o Fluminense se soma à dificuldade de encontrar uma sintonia com um grupo de jogadores que acumula rusgas com treinadores desde 2019.



O desgaste pela falta de melhores resultados é, ainda que precoce, público. Nos corredores do Ninho do Urubu, porém, os motivos são outros. E mais ligados ao relacionamento com os atletas. O novo “Mister” entrou em rota de colisão com parte do elenco por dois motivos: o rodízio no elenco, e até na braçadeira de capitão, e as declarações públicas.

Ainda somado ao rodízio, a utilização de alguns atletas fora de suas posições de origem incomoda algumas lideranças. Em relação às entrevistas, a irritação no grupo de atletas se deu pelas seguidas falas sobre falta de intensidade. Na visão do grupo, há uma exposição desnecessária sobre essas questões.



Apontar o treinador como culpado por problemas do grupo e motivo da falta de resultado, no entanto, tem se tornado uma constante no Rubro-negro. Com exceção do bom momento vivido com Jorge Jesus, toda queda de rendimento é atribuída dentro do vestiário ao comandante de momento.

E até mesmo com o português campeão de tudo houve momentos de tensão. Discussões ásperas de Jesus com nomes como Rafinha e Gabigol foram relatadas por diversas pessoas ouvidas pela reportagem. A bola que entrava e as taças levantadas em sequência impediam que o tumulto do dia a dia se tornasse algo mais problemático.



Com Dome, os problemas, agora diferentes, seguiam. Mas as vitórias já não vinham como antes. Então os questionamentos se tornaram motivos para que a diretoria comprasse o barulho do elenco e demitisse o antigo auxiliar de Pep Guardiola, mesmo com o vice de futebol, Marcos Braz, e o diretor executivo, Bruno Spindel, sendo a favor da permanência.

Um dos pontos que colocaram o catalão e o grupo em lados opostos foi a política de utilização de jogadores nos jogos. Dome só levava para campo quem estivesse 100% fisicamente, sem qualquer sinal de fadiga. O cenário era considerado quase impossível, uma vez que a maratona de jogos gerava sempre algum desgaste.



Em um segundo momento, os jogadores se mostraram descontentes por não concordarem com a metodologia de alguns treinamentos e entenderem que o novo chefe deveria seguir o legado deixado por Jesus, enquanto Torrent tentava dar sua cara ao time.

A diretoria ficou ao lado do elenco. E alguns tropeços facilitaram a tomada de decisão. Começava ali uma rotina onde jogadores definiam, ainda que implicitamente, se o técnico era o ideal para seguir ou não.

Veio Rogério Ceni. O início agradou. E resultados como o título brasileiro prorrogaram uma passagem que por vezes ameaçou ser abreviada. Para os jogadores, o agora técnico do São Paulo não “inventava” tanto e recuperava traços do time de Jesus. Ceni ganhou parte dos atletas com a volta do líder Diego Ribas ao time titular e convenceu com Arão na zaga.

O tempo, no entanto, gerou desgaste no relacionamento. Ciente que o futebol ainda não era o mais vistoso que o elenco poderia entregar, Rogério aumentou o tom nas cobranças. O que foi chamado pelo grupo de “perfeccionismo” e “excesso de cobranças” passou a minar a relação. O tom mais áspero com nomes como Michael deteriorou de vez a convivência. Em um breve comunicado no Twitter na madrugada de 10 de julho de 2021, a diretoria novamente optou por abrir mão de um treinador que colecionava rusgas com o elenco.



Após nova vitória do grupo de jogadores e o diagnóstico de que precisava de um nome para resolver um turbulento vestiário, a diretoria agiu rápido e contratou Renato Gaúcho. Um bom ambiente inicial deu origem a uma sequência de vitórias elásticas. Mas a lua de mel não durou muito. O grupo, mais uma vez, se demonstrava incomodado com um treinador.

Na visão dos jogadores, Renato tinha pouco repertório nos treinamentos e agregava pouco a um grupo que precisava de melhoras às vésperas da decisão da Conmebol Libertadores 2021. E foi justamente na semana da decisão contra o Palmeiras que o copo transbordou. A gota d’água foi a decisão de Portaluppi de não comandar um treinamento matutino para titulares após um duelo contra o Grêmio pelo Campeonato Brasileiro. A relação estava minada. A derrota na grande decisão de Montevidéu sacramentou mais uma demissão.

2022. Ano novo. E a velha busca por um treinador que se encaixasse às vontade do grupo. O ar europeu e moderno de Paulo Sousa agradou no início, mas o tom áspero nas cobranças e uma metodologia totalmente diferente em meio a promessa de reformular todo um departamento que busca o encanto perdido em 2019 novamente incomoda. Novamente treinador e jogadores estão em lados opostos.



E quem se vê pressionado agora também é a dupla de dirigentes que comanda o futebol, Marcos Braz e Bruno Spindel. Após pouco sucesso com Dome, Ceni e Renato, uma nova demissão transformaria o sucesso de 2019 em uma exceção em meio a tantas escolhas erradas.

Solução esbarra em briga política interna

A solução para tanto desgaste passa por cobranças e ações da alta cúpula da diretoria comandada pelo presidente Rodolfo Landim. Mas o apetite para agir diretamente no departamento de Braz e Spindel não é dos maiores. Internamente, aliados defendem que a “bomba” precisa estar no colo de vice-presidente e diretor executivo.

Em meio à eterna guerra-fria entre Gávea (diretoria institucional) e Ninho do Urubu (departamento de futebol), muitos dos cartolas que se opõem a Marcos Braz preferem deixar o agora questionado vice-presidente exposto ao lado de Spindel. Uma saída da dupla que comanda o futebol é pouco provável, mas a pressão aumentará se um resultado imediato não vier.

Nessa “briga”, o futebol fica cada vez mais distante. Não por acaso, Landim e Braz não acompanham a delegação em Lima (Peru) para a estreia da Libertadores, contra o Sporting Cristal. O presidente alega compromissos pessoais que inviabilizam sua ida ao jogo em meio a uma crise interna entre jogadores e técnico, enquanto o vice-presidente optou por ficar no Rio de Janeiro tocando a reformulação do elenco.


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Imagem: Divulgação

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