Coluna do Fla:
O conflito político no Flamengo segue a todo vapor nos bastidores. Agora,
nesta sexta-feira (24), um grupo de sócios rubro-negros enviou carta ao
Conselho Diretor do clube com fortes críticas acerca de diversos assuntos,
citados no documento. O maior alvo dos associados é o atual presidente
flamenguista, Rodolfo Landim, que, segundo o texto escrito, é “viciado em
amadorismo”.
Ex-presidentes do Flamengo, Márcio Braga, Eduardo Bandeira de Mello e Kleber
Leite estão no grupo que assinou a carta direcionada a Landim. Além dos
ex-mandatários, outras figuras conhecidas da política rubro-negra deixaram
seus grifos como Michel Asseff e Sérgio Veiga Brito. Juntos a estes citados,
três candidatos de oposição na última eleição também marcaram presença no
documento, são eles: Marco Aurélio Asseff, Ricardo Hinrichsen e Walter
Monteiro.
A forma de comandar o Flamengo não foi o único tema abordado na longa carta. O
grupo de sócios cobraram, também, uma reformulação do estatuto do Rubro-Negro,
uma espécie de reforma do conjunto de normas e condutas internas. A
contratação de um diretor de futebol a nível internacional foi outra pauta
levada em consideração no documento enviado a Landim.
“O Conselho de Futebol, em vias de esvaziamento, mostrou-se omisso e
despreparado, formado por amadores que podem gostar, mas não entendem de
futebol”, diz um trecho da carta, cobrando o fim do “conselhinho”. Vale
lembrar que Luiz Eduardo Baptista (conhecido como “Bap”) e Dekko Roisman
pediram para sair do Conselho de Futebol do Mais Querido, seguindo o caminho
de Fábio Palmer. Agora, sem os três, apenas Marcos Braz e Diogo Lemos
continuam no grupo criado no início da gestão e Landim.
Leia, na íntegra, a carta de título “O Flamengo precisa avançar – Um
chamamento à diretoria do Flamengo“:
“Falamos ao Conselho Diretor na condição de integrantes do corpo social do
Clube de Regatas do Flamengo. Somos de diferentes correntes políticas,
inclusive egressos da situação e mesmo de nenhuma corrente. Somos sócios
contribuintes, sócios Off Rio, sócios patrimoniais, sócios proprietários,
eméritos, beneméritos, grandes beneméritos, ex-vice-presidentes e
ex-presidentes. Antes de tudo, somos da torcida: estamos pelo Rio de
Janeiro, pelo Brasil, pelo mundo, dentro e para muito além dos muros da
Gávea.
Testemunhamos nos últimos anos como o Clube conseguiu vencer obstáculos até
então considerados intransponíveis e se reerguer. Com muito sacrifício, e
notável colaboração da torcida e do quadro social, o Clube recuperou
credibilidade, diminuiu seu endividamento e voltou a ser potência.
Números em uma planilha não podem expressar o que aconteceu de mais
importante no Clube nesse período: resgatou-se o amor-próprio e o orgulho de
ser rubro-negro. Em um esforço conjunto da Nação, o Flamengo restaurou a
própria dignidade. De cabeça erguida, pôde investir em infraestrutura, no
aperfeiçoamento dos processos de gestão e nas competências profissionais.
O Flamengo se consolidou como um modelo, o Clube Cidadão. Em 2019, a
competência do Flamengo cidadão foi recompensada com a chegada de Jorge
Jesus, que materializou uma temporada de sonhos.
Lamentavelmente, junto com o vitorioso técnico, o profissionalismo, a
competência e a transparência também deixaram o Flamengo. O Clube Cidadão,
cumpridor das leis e dos contratos, respeitoso com o associado e consciente
do seu papel na sociedade brasileira, foi, aos poucos, se perdendo.
Fora das quatro linhas, o Flamengo retrocedeu. Abandonando de forma
voluntária alguns princípios consagrados na administração: moralidade;
publicidade; impessoalidade; eficiência.
Com a criação de novas vice-presidências, ressuscitaram uma prática já
extinta no Flamengo, a de inchar o quadro do Clube para acomodar aliados,
entre amadores e profissionais.
Para cumprir acordos políticos, iniciou-se um processo de perseguição e
demissão de funcionários competentes, substituídos por cabos eleitorais sem
experiência comprovada.
Desde a escolha da agência de propaganda (a mesma que fez a campanha para a
chapa vencedora) até a contratação como diretor de um lobista envolvido com
um grupo dedicado à intimidação de jornalistas. Hoje, a impessoalidade passa
longe da Gávea.
A conveniência e a conivência políticas também provocaram o prejuízo de
milhões na malfadada negociação do contrato com a TV Globo no Campeonato
Carioca, cujo desdobramento foi a implosão da relevância do torneio como
produto.
O Departamento de Futebol é o mais impactado pelos retrocessos na gestão. O
gerente de Futebol, responsável pela contratação de Jorge Jesus, foi
demitido e substituído pelo primo de um dirigente. A contratação de
profissionais de baixa qualidade ou sem experiência por “quem indica”
tornou-se rotineira.
O fim do contrato de consultoria da Exos e a perda do legado construído
pela Double Pass se somaram à defasagem da remuneração dos profissionais do
Departamento de Futebol em relação a outros clubes. Perdemos profissionais
para rivais. Alguns deles na Série B.
A falta de critérios é evidente na contratação e demissão de sete técnicos
que geraram gastos de quase R$ 30 milhões apenas em rescisões, assim como na
renovação de atletas com baixos níveis de rendimento e idades avançadas.
Resultado de um processo de tomada de decisão que a cada dia se mostra
disfuncional. Não é por acaso o arquivamento das propostas de
profissionalização do Clube. O Flamengo está viciado em amadorismo.
O Conselho de Futebol, em vias de esvaziamento, mostrou-se omisso e
despreparado, formado por amadores que podem gostar, mas não entendem de
futebol. Não pode ser chamado nem de “Conselho”, nem “de Futebol”. Até esta
semana, a função do minúsculo “conselhinho” era servir de instrumento de
influência do presidente do Conselho de Administração sobre o Departamento
de Futebol.
Restam, ainda sem explicação, a tentativa de se comprar um clube em
Portugal e a abertura secreta de uma empresa nos EUA em nome do Flamengo no
nome de dois vice-presidentes, sem qualquer consulta prévia ou aprovação
pelos conselhos do Clube. O Flamengo se tornou um inimigo da
transparência.
A prática política da Diretoria reproduz em muitos aspectos o que há de
pior nos piores governos: a sede por sabotar a democracia. Arrogância na
condução dos processos contra o Clube, perseguição aos sócios de oposição,
aumentos abusivos das mensalidades e subsequente limitação no número de
sócios Off Rio, ocasionando a redução do quadro de sócios e do colégio
eleitoral.
Pior, o Flamengo brigou na justiça para descumprir a lei, atuando contra o
direito dos associados, garantido pela Lei Pelé, de votar à distância na
eleição do Clube. E ainda tentou expulsar do quadro social um ex-presidente
por conta do que fala – e não pelo que fez ou deixou de fazer.
Os atuais presidentes do Conselho Diretor e do Conselho de Administração se
ausentam em momentos difíceis. O presidente do Conselho Diretor não fala à
torcida quando a corda aperta. Age como se estivesse mais preocupado em
gerir a própria imagem do que a do Clube. E, nisso, descumpre a promessa de
campanha de cobrança constante. Já o presidente do Conselho de
Administração, figura pública nas horas de vitória, some nas horas de crise,
como se esperasse no banco de reservas.
Provado está que as ações dos dirigentes fora das quatro linhas se refletem
de forma direta no rendimento do Flamengo em campo – campo, aliás, que mal
temos, dada a crônica má qualidade do gramado do Maracanã. Como torcedores e
sócios, é nosso desejo que 2019 não seja apenas um cometa que atravessou a
órbita do Flamengo, sem data prevista para o seu retorno. Ainda restam 30
meses de gestão e os retrocessos não podem mais ser ignorados. Se esses
retrocessos forem corrigidos, ainda há tempo para que o Flamengo retorne ao
caminho das vitórias.
Esta carta é um chamado à ação para a Diretoria. Nós, a exemplo de vocês,
só aceitamos o “vencer, vencer, vencer”. Nós, a exemplo de vocês, almejamos
estar à altura da obra de engrandecimento do Clube iniciada por nosso
presidente histórico José Bastos Padilha. Somos todos Flamengo, e o que nos
une está acima das disputas de poder. Acreditamos que o Flamengo não possa
ser governado sozinho.
Aos vencedores nas urnas, a liderança dos conselhos. A quem não venceu, a
colaboração e cobrança pela governança do Clube. Sem oposição e sem
independentes, sem a cooperação desses no controle e na melhoria dos
processos e do regramento interno, o Flamengo não cresce. Um Flamengo
reservado a alguns poucos coroados, sem disposição para sequer dialogar, é
um Flamengo necessariamente menor.
Por isso, cobramos: a revisão e a redução imediata do papel dos amadores
nos departamentos ligados às vice-presidências de Futebol e Esportes
Olímpicos; a contratação de um diretor de Futebol profissional de nível
internacional, à altura do investimento no Futebol; a extinção e
não-reconstituição do Conselho de Futebol; a reconstituição de uma comissão
técnica permanente no Futebol; a revisão independente do trabalho do
Departamento Médico no Futebol; a revisão independente da atuação da empresa
encarregada da manutenção do gramado do Maracanã; a revisão do reajuste
imposto em agosto de 2020 aos sócios contribuintes Off Rio; o apoio do
Conselho Diretor à derrubada do teto numérico à expansão da categoria Off
Rio; o apoio do Conselho Diretor à colocação em pauta das propostas de
profissionalização do Clube, a começar pelo Futebol; o apoio do Conselho
Diretor à reforma eleitoral com direito assegurado a votar à distância por
meio online e de forma presencial via urna eletrônica; a implantação de uma
estrutura profissional de atendimento ao torcedor rubro-negro visitante,
ligada ao Departamento de Marketing e Comunicação. Cobramos, sobretudo, o
apoio do Conselho Diretor à imediata e ampla reforma estatutária do
Flamengo, conforme compromisso assumido de forma pública durante a campanha
pelo presidente eleito. Essas são medidas urgentes.
Vivemos um momento decisivo na história do futebol brasileiro, de mudanças
que se anunciam profundas na governança dos clubes. Para fazer frente ao
desafio que vem de fora, o Flamengo do amanhã precisa de sócios, e não de
súditos. Sem perseguições. Com reformas. Para seguir líder.
Uma vez Flamengo, sempre Flamengo.”
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Imagem: Divulgação
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