Uol:
Paulo Sousa acertou na formação inicial ultraofensiva do Flamengo para furar o
5-4-1 do Goiás de Jair Ventura. Mas exagerou na cautela no final, reunindo os
quatro volantes do elenco no time para defender o 1 a 0 no Maracanã. Quase
pagou com outro empate nos pés de Apodi em um raro contragolpe cedido.
O gol de Pedro foi a única jogada bem articulada, com precisão no passe de
Gagigol que clareou tudo para Matheuzinho servir o centroavante, livre na
pequena área. No primeiro tempo manteve a entrega na pressão pós-perda e na
movimentação tentando abrir espaços no "ferrolho" de Ventura.
Desta vez houve dignidade dos atletas para não misturar a crise interna com os
interesses do clube, mas continua faltando a jogada diferente que desarticula
o sistema defensivo adversário. Falta mais de Arrascaeta, seja como o meia
mais avançado na formação com dois volantes ou com mais campo para preencher
no 4-1-3-2, cumprindo uma função parecida com a que Gerson exercia.
Coube a Gabigol o papel de "armador" e ele executou muito bem. Só que em jogos
maiores, que necessitam de um meio-campo mais combativo, o camisa nove não vai
barrar Arrascaeta ou Everton Ribeiro e Pedro virar titular. Sua função
essencial ainda é estar na área para finalizar. Será que está fugindo da zona
de conclusão para não perder tantos gols?
A vitória foi importante para esfriar a panela de pressão que, no Flamengo,
está sempre acesa. Na tão aguardada coletiva pós-jogo, Paulo Sousa, Marcos
Braz e Bruno Spindel deixaram bem claro nas entrelinhas que, na ausência de
comando forte e com estofo, os jogadores seguirão impondo suas condições.
Inclusive com lideranças participando de reunião sobre problemas com o
terceiro goleiro, que é a condição atual de Diego Alves.
Com isso, tudo que foi projetado com a chegada de Paulo Sousa cai por terra.
Como renovar o elenco e o time se as lideranças torcem seus narizes para
mudanças e o treinador é obrigado a ceder indefinidamente?
A ideia do 3-4-2-1 atacando e defendendo com duas linhas de quatro, com
amplitude, profundidade, triangulações, busca do homem livre, ala do lado
oposto entrando na área para finalizar...tudo se perdeu depois dos dez dias de
treinamentos antes do primeiro Fla-Flu da final carioca.
A pré-temporada foi desperdiçada. Basta ver a diferença entre o melhor
rascunho da proposta de Sousa, contra o Atlético Mineiro em Cuiabá pela
Supercopa, e o time atual, que parece mais, no desenho, na execução e nos
defeitos, com a equipe dos tempos de Rogério Ceni e até Renato Gaúcho.
O buraco pela esquerda, aproveitado por Mayke na final da Libertadores, ainda
está lá quando jogam Filipe Luis e Bruno Henrique. O lateral muito recuado, o
ponta mais avançado, quase como um terceiro atacante. Ayrton Lucas entrou e,
mais jovem e com saúde e dinâmica, vem procurando compensar o problema. A
volta de Rodrigo Caio também ajudou a arrumar a retaguarda.
Pela direita, a jogada entre Gabigol e Matheuzinho surpreendeu, mas quando
envolve Everton Ribeiro e Isla já está mais que manjada pelos rivais. E segue
faltando o volante que faz inversões mais longas para pegar o companheiro
aberto contra apenas um marcador. Andreas Pereira é o que mais acerta esse
tipo de passe, porém não é confiável na execução das demais funções.
Paulo Sousa cedeu e a flexibilidade é uma virtude. O problema é que, diante da
autoridade dos atletas que tiram o respaldo da direção, o caminho é sem volta.
Até pelos contratos longos da maioria, tirando a "geração 1985" cujos acordos,
pelo menos a princípio, vão até o final do ano.
Nas entrevistas, o treinador português fala que "pagou para estar aqui". Nos
bastidores, se nega a pedir demissão, mesmo diante de tantos problemas
inesperados. Não quer pagar outra multa, nem mudar de cidade. Talvez acredite
em uma sobrevivência para 2023 e nova tentativa de reformulação.
Mas o fato é que hoje o trabalho perdeu o sentido. Mergulhou na vala comum dos
técnicos brasileiros: rende-se às politicagens e aos privilégios, arma o time
escalando as "vacas sagradas" e tentando manter o emprego jogo a jogo na base
do resultadismo.
Com cinco "avançados" ou quatro volantes na mesma partida. A única diferença é
o olhar para os jovens da base, mas isso Fernando Diniz, Dorival Júnior e até
Vanderlei Luxemburgo também têm como virtude.
Sousa hoje é um personagem sem rosto, que abriu mão de tudo, até de suas
ideias. Com sua comissão numerosa e cara, mas também sem autonomia e submetida
a uma estrutura amadora. Um enorme desperdício.
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Imagem: Reprodução
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