Por André Rocha | Uol:
No dia oito de agosto, o Flamengo levou 4 a 0 do Internacional no Maracanã.
Havia poupado titulares no meio da semana contra o ABC em Natal, partida de
volta pelas oitavas da Copa do Brasil. Mas na quarta, dia 11, havia a ida das
quartas da Libertadores contra o Olimpia, em Assunção.
Contra o Sport, no dia 15 em Volta Redonda, vitória protocolar por 2 a 0,
freio de mão puxado e Willian Arão e Bruno Henrique nitidamente forçando
cartões amarelos que suspendiam a dupla para o jogo contra o Ceará, em
Fortaleza, no domingo seguinte. Jogariam tranquilos na quarta, para confirmar
a vaga nas semifinais do torneio continental.
De Arrascaeta jogou em Brasília contra o time paraguaio, mesmo com a
classificação mais que encaminhada por um 4 a 1 no Paraguai. Mas sequer viajou
para a capital cearense, mesmo com a equipe já muito desfalcada. Empate por 1
a 1 e Renato Gaúcho colocou muitos garotos, como quem faz experiências e dá
minutos a quem não vem atuando, como se os três pontos não tivessem tanta
importância.
Todos retornaram, claro, na ida contra o Grêmio , em Porto Alegre, pela ida
das quartas do mata-mata nacional. 4 a 0 com um homem a menos no segundo
tempo, classificação encaminhada.
Aí, sim, foi possível olhar para o Brasileiro com seriedade. Na Vila Belmiro
contra o Santos, a última partida antes de longa pausa para a data FIFA. Não
havia razão para poupar atletas e esforços. 4 a 0 no time então comandado por
Fernando Diniz.
Na volta, clássico nacional contra o Palmeiras. Jogo envolvendo rivalidade
recente, para manter uma invencibilidade que era de oito partidas. Mesmo muito
desfalcado, a entrega foi absoluta no triunfo por 3 a 1. Também porque na
quarta, novamente, o confronto havia sido definido na ida. O próprio Grêmio
demonstrara que havia jogado a toalha ao confirmar time misto, com alguns
jogadores nem viajando para o Rio de Janeiro.
Mas no domingo seria "a vera", até pela necessidade de pontuar do time gaúcho
para fugir do Z-4. Titulares de volta e a proposta de jogar com as armas
possíveis no momento: jogo físico, travado e apostando em concentração
defensiva e velocidade nas transições ofensivas.
Felipão ainda avisou que aproveitaria a experiência das derrotas anteriores,
mesmo com humilhantes 6 a 0 no agregado, para tentar encerrar uma sequência de
10 partidas sem vencer o time rubro-negro, desde 2018. Era "final" para o
tricolor gaúcho.
O que Renato Gaúcho fez de diferente para tentar surpreender o rival?
Absolutamente nada! Diego Alves e Arão, poupados na quarta, retornaram e Isla
voltou da suspensão pelo cartão vermelho em Porto Alegre. Manteve estrutura e
proposta, sem novidades.
Bem diferente, por exemplo, de Cuca, que quando enfrentou o Fluminense duas
vezes seguidas no Rio mudou a ideia na segunda partida, pela ida da Copa do
Brasil. No empate por 1 a 1 pelo Brasileiro, time no campo de ataque e dando
espaços ao tricolor. Três dias depois, linhas mais recuadas, apostando em
contragolpes e vitória por 2 a 1. Na coletiva pós-jogo, ressaltou que não
poderia facilitar o trabalho do adversário fazendo as mesmas coisas.
Pois o Flamengo jogou uma partida fundamental nos pontos corridos com o mesmo
comportamento da quarta, em um confronto resolvido. Mesmo percebendo que o
Grêmio era diferente, na formação e no espírito. Fechando bem a entrada da
área em um 4-1-4-1 e acelerando pelos lados, com Alisson e Ferreira, além de
Borja se embolando e provocando Rodrigo Caio.
Ritmo lento e desatenção no último lance da primeira etapa, com Ferreira tendo
tempo e espaço para calcular e colocar na cabeça de Borja, subindo entre Léo
Pereira e Renê. O Flamengo não colocava intensidade, com jogadores nitidamente
temendo entradas mais duras. Afinal, na quarta tem ida da semifinal da
Libertadores em casa contra o Barcelona de Guayaquil.
Aos 20 do segundo tempo, as primeiras substituições de Renato. Pedro no lugar
de Vitinho e Bruno Henrique na vaga de... Everton Ribeiro. O camisa sete saiu
sentindo as muitas pancadas que levou, mas poderia ter seguido em campo. Só
que, na quarta, Arrascaeta provavelmente não estará em campo, por conta da
lesão muscular contra o Palmeiras. Questão de prioridade.
Empilhando atacantes e sem articulação no meio, o Fla nada criou e se livrou
de tomar o segundo, com Diego Alves pegando cobrança de pênalti de Borja. No
final do jogo, sorrisos de Renato Gaúcho com seus ex-comandados no gramado e
Diego Alves, na entrevista, minimizou a derrota e se limitou a dizer que "tem
muita coisa pela frente".
Talvez acreditando na repetição do perde-ganha do ano passado, com São Paulo,
Atlético-MG e Internacional derrapando e o time, mesmo sem brilhar e perdendo
na última rodada, confirmando o título. Pode acontecer, mas agora há um Galo
focado, ligado. Com Cuca tratando cada partida como decisão, assim como fez
quando comandou o Palmeiras em 2016. Agora abrindo 11 pontos, com apenas dois
jogos a mais.
É claro que há tempo para reviravoltas. Mas existe agora uma diferença
fundamental em relação à temporada passada: o foco. Eliminado nos torneios, o
Fla se concentrou no Brasileiro. Agora a possibilidade de chegar às duas
decisões de mata-mata é considerável.
E há Renato Gaúcho, um treinador que já demonstrou seguidas vezes que pontos
corridos não o seduzem. Poupar, fazer experiências, guardar energias quando a
ladeira a subir é muito íngreme, só no Brasileiro. Ou em confrontos
eliminatórios bem encaminhados. Se houver um desafio mais complicado na
quarta, o desempenho no fim de semana sempre fica comprometido.
Não significa que basta querer para o Flamengo vencer. Houve méritos de
Internacional, Ceará e agora Grêmio. Mas o padrão é claro: o time sempre foi
mal e deixou pontos antes das partidas de ida do mata-mata tratadas como mais
difíceis - excluindo, obviamente, o confronto com o ABC.
E isso porque o Flamengo foi feliz nos sorteios e encontrou chaveamentos menos
complicados. Imagine se estivesse do lado do Galo e tivesse uma semifinal
continental contra o Palmeiras, atual campeão. Cuca poupou algumas peças, mas
seu time jogou com a fome habitual e enfiou 3 a 0 no Sport.
Eis a diferença de mentalidade. O Flamengo quer "escolher" jogos para se
dedicar. Como Renato sempre fez em sua carreira, de jogador e treinador. Só
que agora há um concorrente que não vem dando brechas. Assim não há a mínima
condição de duelar na disputa que exige regularidade, consistência.
O terceiro título consecutivo, feito que seria inédito para o clube e que só o
São Paulo alcançou na história, ficou bem mais complicado para o bicampeão.
Mas na quarta o Barcelona, certamente, encontrará outro adversário no
Maracanã.
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Imagem: Jorge Rodrigues/AGIF
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