Carinho com funcionários, papos com atletas e cobrança: como 'agregador' Renato Gaúcho deixou bastidores do Flamengo mais leve




Por Pedro Henrique Torre | ESPN: Ao chegar em um dia para treinar no Ninho do Urubu, Renato Gaúcho percebeu a ausência de um dos funcionários assíduos do dia a dia do CT. Procurou se informar. Soube que o motivo era um problema pessoal. Buscou o contato, passou a mão no telefone e ligou para saber o que de fato tinha ocorrido. Talvez o número do comandante rubro-negro na tela do telefone tenha até assustado o funcionário do outro da linha. Não era cobrança. Renato desejava apenas saber como poderia ajudar.



Não foi a primeira vez desde que chegou ao clube, em julho. Repetiu a mesma atitude em outras oportunidades. É um exemplo de como o comandante modificou o ambiente rubro-negro para que o resultado tenha reflexo em campo. Preza por isso.

Ao seu lado no cotidiano do Ninho tem como testemunha a representação de uma vida dedicada ao Flamengo: o massagista Adenir Silva. No próximo mês, em outubro, Denir vai completar 40 anos de clube. É caso raro de quem frequentou os corredores e vestiários nos dois anos de ouro rubro-negros, 1981 e 2019. Figura querida dos jogadores, Denir dá sempre a bênção a Gabigol antes dos jogos. Espera cada atleta na porta do vestiário dos estádios.



Com o Camisa 9 o ritual é o mesmo: recebe na mão um beijo do artilheiro antes que ele entre no local. A proximidade com Renato é ainda maior. Vem de 1987, ano do tetracampeonato brasileiro. Renato tinha 25 anos, era artilheiro e explosivo como Gabigol. Denir tinha acabado de subir para trabalhar com os profissionais. Entre eles Zico, Bebeto, Leandro e o furacão Renato.

“Renato é muito identificado com essa camisa. Tem a cara do Flamengo. História dele aqui é linda. Tem tudo para ser igual ou melhor como treinador. Depois do Zico, foi o jogador mais povão. Atendia todo mundo com sorriso no rosto. Torço muito por ele”, derrete-se Denir.



Não é para menos. Na década de 80, Denir acompanhou de perto o então atacante deixar o lado irreverente, até debochado e provocador no lado externo. Dentro do clube, longe de qualquer holofote, a preocupação era direcionada aos funcionários de menor salário, como massagistas e roupeiros. A eles chegou a dar bichos integrais recebidos após as vitórias. Patrocinado por uma famosa rede de churrascarias no Rio de Janeiro, Renato ganhava vales para refeições grátis. Distribuía justamente à turma que pegava mais duro no batente para fazer o dia a dia da Gávea girar.

Em 2021, o técnico já não tem patrocínio de churrascaria e nesta fase rubro-negra tem sido menos provocador nas entrevistas. A atenção interna, no entanto, continua a mesma. Renato busca saber se os funcionários têm recebido corretamente os 'bichos' referentes às vitórias que o time conquista, por exemplo. Faz questão de monitorar. Até agora com ele foram 14.



Chama atenção o fato de o perfil do técnico não se restringir apenas ao de boa praça. Renato, claro, mantém o lado divertido no Ninho do Urubu. Seduz e cultiva o bom ambiente assim. Os momentos mais intensos de trabalho, no entanto, o transformam. Os relatos apontam para um técnico exigente na cobrança de horários e determinadas atividades a atletas e auxiliares.

O tom sobe, obviamente. Mas sem rusgas. O ambiente, já sufocado na reta final da era Rogério Ceni, foi suavizado com o estilo Renato Gaúcho de tocar o dia a dia. Por vezes chama atletas em cantos para conversas reservadas em áreas do Ninho. Tenta passar confiança, entender o momento e abrir espaço para ouvir a ideia de como melhor aproveitá-lo em campo. Um estilo que o técnico traz desde a década de 80 e considera o pilar de suas relações nas vidas pessoal e profissional.



“Agregador. Defino ele com essa palavra. Só tenho boas lembranças dele dos tempos de jogador. Olhava por aqueles que não tinham muitas condições. Uma vez me deu um micro-ondas, sem eu pedir. Naquela época era um luxo. É uma pessoa muito especial”, afirma Denir.

Dentro de campo, o Flamengo vai bem. Semifinalista de Copa do Brasil e Conmebol Libertadores e na briga pelo tricampeonato consecutivo do Brasileiro. Reflexo da melhora fora, no CT rubro-negro, após a chegada professor Renato.

Ao que parece, 34 anos depois o ex-atacante driblador usa os atalhos da vida. Trabalha à miúda, pensa nos detalhes e nos pilares, longe do campo, para implementar o estilo necessário e oxigenar o dia a dia que torne o Ninho do Urubu leve na medida certa.


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Imagem: Reprodução

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