Na véspera da final da Copa Libertadores , um artigo no jornal “The New York Times” perguntou: a América do Sul pode ter um superclube de futebol? A resposta que o Flamengo tem a oferecer é um cristalino sim.
Endossam essa constatação o consistente trabalho de recuperação financeira, os recentes troféus do Brasileiro e da Libertadores, a maneira como foram conquistados e a palpável sensação de que o clube vai disputá-los como favorito em 2020.
Mas há um obstáculo imponente no caminho do Flamengo —e de qualquer clube que pretenda ser mais do que um fornecedor de pé-de-obra para a elite da Europa: é impossível atingir tal patamar fora de um ambiente profissional, previsível, civilizado, tudo que o futebol brasileiro insiste em não ser.
Não há superclube viável na configuração-padrão dos brasileiros: que dispute 80 partidas por ano com um elenco de 40 jogadores dirigidos por quatro técnicos diferentes, que impeça seus craques de defender seleções, que descubra na véspera de jogo importante que sua torcida não poderá estar no estádio, que tenha profissionais intimidados pelos próprios torcedores em aeroportos.
Entre junho e julho do ano que vem, o Campeonato Brasileiro não será interrompido para a disputa da Copa América, torneio que faz parte do calendário do futebol mundial desde outubro de 2018. A chancela da Fifa obriga os clubes a liberar todos os convocados por suas seleções.
Se o elenco atual for mantido para o ano que vem, não é absurdo imaginar o Flamengo obrigado a atravessar pelo menos dez rodadas da Série A sem Rodrigo Caio, Filipe Luís, Gerson, Everton Ribeiro, Bruno Henrique e Gabigol, além de Piris da Motta, Berrío e De Arrascaeta. Vai ficar muito claro, como se já não houvesse exemplos em profusão, que o sistema pune quem trabalha bem para reter ou contratar os maiores talentos.
Numa entrevista recente aos repórteres Rodrigo Mattos e Léo Burlá, o diretor de futebol do Flamengo, Bruno Spindel, afirmou que a boa passagem do zagueiro espanhol Pablo Marí pode atrair outros jogadores europeus. Faz sentido. Mas será preciso explicar aos estrangeiros que defender um clube brasileiro significa se afastar do futebol de seleções — no limite, da Copa do Mundo. Basta constatar que Gerson nunca foi convocado por Tite, aberração que seria evitada se o meia atuasse na Fiorentina ou no Shakhtar Donetsk.
Por irracional, o debate sobre a responsabilidade de CBF, clubes, federações estaduais, patrocinadores e detentores de direitos, já se provou estéril. Há mais interessados (e empenhados) em apontar dedos e evitar assumir responsabilidades do que gente preocupada em pensar soluções. Não se trata de infantilismos do tipo “romper com o sistema”, mas de melhorá-lo.
O ano que termina mostrou que o Flamengo pode reinar num cenário assim. Mas será melhor para todos, sobretudo para o próprio Flamengo — como a Copa América de 2020 deixará exposto —se o futebol brasileiro for conduzido de maneira mais racional. Soberano em campo e sem dívidas com sua própria torcida, quem tem poderes para se tornar superclube poderia liderar a discussão.
Fonte: https://oglobo.globo.com/esportes/o-futebol-brasileiro-o-principal-obstaculo-paraflamengo-ser-um-superclube-24124133
Curta nossa Página