Se for coroado por conquistas, Jorge Jesus colocará uma série de debates na agenda nacional



Por Carlos Eduardo Mansur | O Globo: A admiração de boa parte do Brasil Jorge Jesus já conquistou. Nos próximos dias, a começar pelo Fla-Flu de domingo, algo mais significativo estará em jogo: o tamanho do legado, da influência do português. Pautar novos debates é herança fundamental que o futebol brasileiro pode receber ao se abrir para o mundo.

Daqui a seis dias, este Flamengo pode ser finalista da Libertadores após 38 anos e ainda mais favorito ao título brasileiro caso vença o clássico com o Fluminense. Mas não se trata apenas de medir resultados, o que nos interessa aqui é a forma de obtê-los.

Foi muito marcante a imagem final do jogo em Fortaleza, na quarta-feira: sete jogadores estirados no gramado após o apito final, algo imediatamente relacionado com a sensação de um time extenuado. É marca deste Flamengo a forma intensa de jogar e, fundamentalmente, a pressão no campo ofensivo, a diminuição de espaço concedido ao adversário através de um time compacto. O melhor meia-armador do Flamengo de Jorge Jesus é a roubada de bola no campo de ataque, permitindo ataques rápidos contra defesas nem tão organizadas.
Ocorre que, no Brasil, tal forma de jogar é associada a uma cultura de esforço, a uma mera questão de vontade. E, claro, à capacidade física do time. Uma meia verdade.

Todos estes elementos são necessários, mas o Flamengo o faz também com organização, com uma linha de defensores habituados a jogar longe do próprio gol e acostumados a encurtar espaços, e com dois meias — Gerson e Willian Arão — que atacam, defendem e cobrem grandes porções de campo. E, claro, com talento e manejo da bola. Um time que tem, em média, 57% de posse a cada jogo prova que não é preciso “correr 90 minutos pressionando o adversário”. Muitas vezes, é o rival que corre atrás do Flamengo.
E Jesus imprime seu sistema usando ao máximo a base titular e mostrando estranhamento diante da proliferação dos times reservas no país. É um choque cultural, afinal. Joga-se demais no Brasil, o que dá certo sentido à rotação de jogadores. Ainda que haja abusos e tentativas de esvaziar jogos diante da pressão por resultados.

Se Jesus conseguir, com seu jogo de pressão, intensidade e titulares usados ao limite, levar o Flamengo a ultrapassar os próximos obstáculos, uma série de debates estarão na agenda nacional. Alguns, mais rasos, limitando-se a cobrar mais empenho de jogadores, como se apenas disso se tratasse. Outros, mais relevantes, serão o efeito natural de times bem-sucedidos: estabelecer novos padrões do que é “jogar bem”. Nem todas as arquibancadas do país aceitarão times espaçados, lentos. O “modelo Flamengo” será um parâmetro, ainda que seja apenas uma das tantas maneiras de se jogar bem futebol. O Santos de Sampaoli, ao liderar o torneio com um estilo autoral, já provocara efeito similar.
Até aqui, mesmo no insano calendário brasileiro, o Flamengo tem sustentado seu futebol de alta intensidade. Os próximos dias dirão se a aposta de Jorge Jesus em ir ao limite das pernas do elenco resistirá à reta final da maratona brasileira. Se vencer a seu modo, terá oferecido ótimos argumentos a quem critica a excessiva preservação de titulares no Campeonato Brasileiro.

Ao se abrir a outras culturas de jogo, o país se alimenta de novas e saudáveis discussões.



Fonte: O Globo

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