Por Leonardo Miranda | GE:
Mesmo que tenha vencido novamente o Vasco e irá para sua quarta final de
Campeonato Carioca seguida, a versão 2022 do Flamengo ainda não é capaz de
deixar nem o mais otimista torcedor seguro. Não é pelo resultado, muito menos
pela forma como o time se organiza. É pela sensação de que a equipe oscila
mais do que o normal e esperado.
A percepção se dá pelo desempenho contra adversários de maior nível. Contra o
Fluminense, um primeiro tempo seguido de uma etapa ruim. Contra o Atlético-MG,
um início avassalador e erros na etapa final. Nesse segundo duelo contra o
Vasco, um sinal amarelo foi ligado: os problemas defensivos de cobertura da
defesa.
Antes de mais nada: é preciso reconhecer o mérito de Zé Ricardo
O Vasco criou cinco chances de gol no primeiro tempo. Todas em jogadas
semelhantes, com a zaga e os laterais desprotegidos e a dupla de volantes,
formada por Arão e João Gomes, muito longe da defesa. O truque foi deixar
Raniel, Pec e Figueiredo mais à frente, jogando no setor entre a linha de
defesa do Fla e o meio-campo. Nenê, que fez excelente partida, buscava a bola
de trás e confundia os volantes do Fla. Nesse momento se abria um espaço muito
bem aproveitado pelo Vasco.
Agora, vamos entender como o Flamengo se defende
O Fla joga num 4-2-3-1. Com a bola, o desenho é bem nítido e forma uma linha
de três atrás. Mas na defesa, o Flamengo se defende com quatro defensores bem
alinhados e dois pontas retornando, formando uma segunda linha com os
volantes. Contra o Vasco, Pedro e Arrascaeta ficavam mais à frente e quem
fazia esse retorno junto aos meiocampistas foi Gabigol e Lázaro.
Só que esse quarteto ofensivo não foi bem ao tentar roubar a bola lá na
frente. Eles subiam, tentavam encurtar o espaço e não deixar o Vasco jogar. Só
foram pouco intensos. Veja na imagem um exemplo: Gabigol e Lázaro meio que "se
desligam", e Nenê consegue conduzir a bola nas costas de Gabigol.
Pressão de Gabigol não anula a jogada do Vasco — Foto: Reprodução
No futebol, tudo está conectado. É como o filme "Efeito Borboleta": um erro lá
na frente provoca uma consequência, que muda todo o futuro. A consquência da
falta de pressão na frente era que Arão e Gomes tinham que subir muitos metros
pra longe da defesa. Eles faziam isso para cobrir o ataque e tentar adicionar
mais gente nesse momento de pressão.
O problema é que eles deixavam a defesa sem cobertura. E aí Fabrício Bruno e
David Luiz se viam no mano a mano com Raniel e Pec. Estar no mano a mano
aumenta a chande de erro e drible. Nesse lance, Rodinei avança pela direita
para marcar Nenê, já que Gabigol deixou. Quando o passe sai, a defesa do Fla
está muito exposta e os dois volantes ainda estão longe, com Arão ainda
voltando.
Defesa do Flamengo fica exposta à Raniel — Foto: Reprodução
Reorganizar as coberturas pode ser uma solução
Outro exemplo: o quarteto do Fla está bem compactado. Arrascaeta até sinaliza
para Lázaro subir e pressionar o zagueiro. Mas eles novamente deixam o passe
sair. Se a pressão na frente tem como objetivo causar desconforto e evitar uma
saída do adversário, o quarteto ofensivo precisa sufocar ao máximo, até parar
na chamada falta tática.
Quarteto ofensivo não anula a jogada e volantes do Fla ficam sobrecarregados —
Foto: Reprodução
Vai conseguir todas? Não vai! O jogo é essencialmente uma coleção de erros. É
para estar protegido quando o adversário sair de trás que os defensores se
organizam para cobrir a pressão. E o Flamengo se organizou mal nesse jogo
contra o Vasco.
Paulo Sousa gosta que ao menos três jogadores fiquem sempre atrás, fazendo
essa cobertura. Dois mais abertos e David Luiz centralizado. Podem ser três
beques de ofício ou Filipe Luís mais recuado. Abaixo, um exemplo da cobertura
mal-feita: como os volantes estão distantes, Filipe Luís salta e pressiona a
bola. O zagueiro central deveria fazer isso e os zagueiros laterais acompanham
os pontas. David Luiz está muito longe, o que sobrecarrega Fabrício Bruno na
cobertura.
Defesa do Flamengo fora do lugar — Foto: Reprodução
Vendo o lance, o Vasco tem quatro atacantes contra quatro defensores do Fla. É
uma igualdade numérica. Mas Nenê consegue dar o passe para Pec, que tem um
espaço imenso para conduzir. Há uma vantagem posicional do Vasco.
Paulo Sousa viu tudo isso e deu a explicação na coletiva:
A cobertura no corredor direito era com maior foco do João Gomes, mas em
alguns momentos o Arão teve esse posicionamento. Nos primeiros 20 minutos, tão
errôneos com a bola, fez com que o próprio Arrasca, em termos de intensidade,
não se reposicionasse no momento da perda. Temos que estrategicamente ter
elementos que nos possam favorecer. Várias vezes no primeiro tempo teve
jogador do Vasco sem pressão que conseguia encontrar um companheiro livre nas
costas do nosso meio de campo. Isso nos levou para trás. Nos outros jogos
controlamos melhor.
Veja como novamente tudo se conecta. Não é apenas Willian Arão ou Gomes que
esteve mal, mas todo o time. Se Arrascaeta não faz a recomposição, Gomes fica
exposto e sobra para Fabrício Bruno. Mesma coisa pelo lado esquerdo. Pedro,
por exemplo, muitas vezes não se reposicionou para recompor e pressionar a
bola. São precisos pequenos ajustes de posicionamento e principalmente timing.
Além da fome de gols e títulos que o treinador português já cobrou, agora uma
nova questão se abre: tornar o Flamengo mais seguro e melhorar as coberturas
na defesa para não sofrer tanto na final do Campeonato Carioca, contra
Fluminense ou Botafogo.
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Imagem: Marcelo Cortes