Joia 2021: da epopeia no Amazonas ao surpreendente 2020, Werton se mete em grupo seleto do Flamengo



Paciência é uma característica que Werton aprendeu a desenvolver desde muito cedo. As muitas horas de barco entre Benjamin Constant, na fronteira com o Peru, e Manaus representaram apenas o primeiro desafio de um jovem que soube esperar para se colocar numa fila de promessas que andou rápido no Flamengo nos últimos anos .



Da trajetória da cidade amazonense, de onde saiu com apenas seis anos, aos 11 gols marcados em 16 partidas em 2020, foi preciso encarar mais de uma década de dúvidas, poucas oportunidades e uma tragédia. A geração do atacante de 17 anos foi a mais afetada no incêndio do Ninho, que escondeu o sorriso marcante da joia para próxima temporada . Status que pode ser dividido também com o de surpresa na base do Flamengo.

Diante do histórico de joias do quilate de Vini Junior, Lucas Paquetá, Reinier, Jean Lucas e Yuri César nos últimos anos, é preciso pontuar que Werton vive realidade diferente. Nunca foi apontado como fenômeno precoce como os antecessores e demorou a atingir a maturidade física e técnica que o permitisse destacar. A aposta de um clube com tamanha concorrência, entretanto, evidencia o potencial desse nortista já com alma carioca.



"Sofri muito por conta do físico. Era franzino, pequeno, todos eram maiores e mais fortes. Quase não joguei por muito tempo e teve um momento que perguntei aos treinadores o que estava acontecendo. Eles disseram para eu ter calma e confiar, que o clube apostava e eu ia estourar"

- Cheguei a ir com meu pai a uma clínica para ver se ia crescer mesmo ou não. Só depois que ganhei carcaça que passei a ter mais minutagem - relembra o atacante já com 1.81m.

Até ganhar mais minutos com a camisa rubro-negra já aos 16 anos, foi preciso encarar horas e mais horas para cruzar mais de 1.600km pelos rios Solimões e Javari. Por conta da correnteza, o trajeto entre a cidade natal e Manaus dura três dias e meio de ida e outros seis dias de volta . Percurso necessário pela urgência para tratamento nos olhos da irmã mais nova e que encurtou o caminho de Werton ao Rio de Janeiro.





Werton fez teste no Flamengo em 2013, ainda com nove anos — Foto: Arquivo Pessoal

A desenvoltura na escolinha do Flamengo na capital do Amazonas dos seis aos nove anos fez com que o pai, auxiliar de almoxarifado, acreditasse que valia a pena gastar as economias para colocar à prova o menino que sobrava nas quadras de Manaus. Os muitos e-mails enviados tiveram duas respostas: uma do Botafogo e outra do próprio Flamengo, a escolha imediata.

- A ideia do meu pai era ter uma noção do que eu precisava melhorar para voltar depois de mais velho. No primeiro dia de teste, não fui bem e ficamos decepcionados, achando que era viagem perdida. Com o passar da semana, fui melhorando e no último dia o técnico foi falando os nomes de quem tinha passado. Eram uns 60 e ficamos seis. Nem acreditei, comecei a chorar e saí correndo.





Já em 2019, Werton participou de treinamentos com os profissionais — Foto: Arquivo Pessoal

Com o talento comprovado, era necessário convencer a família de que a passagem de volta para Manaus seria perdida. A programação previa pegar experiência e voltar anos depois. Werton chegou até a ganhar uma camisa como recordação do treinador Marcos Lourenço em uma despedida frustrada . A presença no treinamento da semana seguinte, no entanto, era o sinal da escolha inesperada.

Em vez de Werton e o pai voltarem para Manaus, a mãe e a irmã embarcaram para o Rio, onde o quarteto dividiu por anos uma kitnet e perrengues na trajetória do menino talentoso e que não crescia. A paciência do começo do texto se fazia presente dia após dia no pequeno cômodo em Vargem Pequena:



- Minha avó morava na Ilha dos Pescadores, mas era longe do Ninho. Nos mudamos para ficar mais perto, mas não tinha cama, geladeira, nada... Compramos aqueles colchões infláveis e logo no segundo dia ele furou (risos). Foram momentos difíceis e que me ajudaram a valorizar o que tenho agora.

E o que Werton tem é um contrato de três anos assinado no final de dezembro. A multa de 50 milhões de euros (R$ 313 mi) deixa claro que valeu a pena esperar crescer e “ganhar carcaça” para realizar o sonho do primeiro vínculo profissional. Fruto do bom e surpreendente desempenho pelo Sub-17 e Sub-20 em 2020.



Pequeno Werton sofreu com dúvidas por conta do porte franzino — Foto: Arquivo Pessoal



Os 11 gols em 16 partidas na temporada colocaram em alta a promessa que até então chamava mais a atenção nos bastidores pela simpatia e bom humor do que pelo que fazia em campo. Assíduo nas redes sociais, Werton sempre foi a chamada figuraça que reúne todos a sua volta nos corredores do Ninho.

Alegria à base de dancinhas e piadas que silenciaram em 8 de fevereiro de 2019. A vencedora geração 2003 foi a mais impactada pela tragédia no centro de treinamento. Das dez vítimas fatais, três eram companheiros de time de Werton: Christian Esmério, Samuel Thomaz e Jorge Eduardo .

- Eles eram os capitães do time, principalmente o Samuel. Foi um cara que sempre me apoiou, falava para eu ficar calmo, dizia para manter a seriedade nos treinamentos no período que eu não jogava por ser franzino. O que aconteceu foi um choque. Lembro que meu pai me acordou com a notícia e eu não acreditei, não levei a sério.



"A ficha demora para cair. Como é normal perder contato na base, parecia que eles tinham ido para outro clube, mudado de cidade. O ano todo foi assim, mas o clube nunca nos colocou pressão. Decidimos jogar por eles, também é o sonho deles, e sempre falamos isso no vestiário"



Werton em post com foto dos amigos Samuel e Jorge — Foto: Arquivo Pessoal

Atacante de lado, Werton descobriu a faceta goleadora jogando aberto pela esquerda no Sub-17 e cortando para dentro, para a perna direita em busca de espaços para finalização. No Sub-20, passou a ser mais utilizado do outro lado do campo e apresenta ao ge suas características:

- Minha posição de origem é pela esquerda, gosto de cortar para o meio, mas esse ano joguei muito também pela direita. Senti um pouco de dificuldade por ser o lado da perna boa, mas me adaptei bem. É importante fazer várias funções. Meu projeto para 2021 é conquistar títulos. Se ficar no Sub-20, vai ser uma grande oportunidade de amadurecer com os mais velhos e voltar para o 17 mais firme. O que acontecer, vou ficar feliz.



No Flamengo que entra em campo nesta segunda-feira para buscar uma vaga na semifinal do Brasileirão Sub-20, contra o Fluminense, nas Laranjeiras, Werton é coadjuvante. Quase que um intruso por ter idade para categoria inferior, tal qual a surpresa que se tornou entre as joias do Flamengo. A joia que aprendeu nas águas da Amazônia a importância de saber esperar.


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