O torcedor do Flamengo que hoje comemora uma fartura de títulos e sonha com o Mundial sabe o que sofreu até chegar a esse momento. Após décadas de irresponsabilidade financeira, cofres vazios, o clube começou a arrumar a casa a partir da gestão de Eduardo Bandeira, em 2013, e hoje colhe os frutos. Foram aproximadamente R$ 214 milhões investidos para reforçar a equipe, incluindo aquisição de direitos econômicos, luvas e intermediários. Valor recorde na história do clube.
Seria leviano, no entanto, apontar apenas o salto financeiro como segredo do sucesso do Flamengo em 2019. De fato, ter poder de investimento foi o primeiro e fundamental passo para formar um time campeão. Seria impossível unir tanta qualidade em campo sem dinheiro. Mas a política de contratações e os tiros certeiro foram essenciais.
Impulsionada pela venda de Lucas Paquetá, a gestão de Landim recebeu de Eduardo Bandeira o Flamengo com os cofres cheios e teve o mérito de praticamente gabaritar no mercado. Com uns dos maiores orçamentos para contratações da história do futebol brasileiro, oito dos nove reforços são titulares absolutos e renderam acima da expectativa. Apenas o jovem João Lucas, contratado como aposta após bom Carioca pelo Bangu, ainda busca espaço. A equipe titular foi quase toda reformulada.
Fonte: Demonstrativo financeiro do Flamengo *Embora o demonstrativo aponte 70%, o Flamengo adquiriu 45% de Rodrigo Caio. Por contrato, o clube pode comprar mais uma parte dos direitos em 2019 junto ao São Paulo
Comitê de futebol
Nomes fortes da gestão, como o vice de futebol Marcos Braz e o vice de relações externas, Luis Eduardo Baptista (BAP), se uniram a jovens dirigentes da política rubro-negra para decidirem os rumos do futebol. E apesar das divergências, expostas na queda de braço pela permanência ou demissão de Abel Braga, o grupo se mostrou eficiente e certeiro, com praticamente 100% de aprovação nas contratações. O comitê termina o ano fortalecido.
- Marcos Braz
- BAP
- Dekko Roisman
- Diogo Lemos
- Fábio Palmer
O grupo sugere e aprova nomes, mas não está na linha de frente nas negociações. Os homens de mercado são o vice de futebol Marcos Braz (membro do comitê) e o diretor-executivo Bruno Spindel – assumiu o posto de Carlos Noval na metade do ano, mas participou desde o início de todas as negociações. A dupla se mostrou entrosada e convincente no mercado. Não foram poucos jogadores contratados que citaram o poder de persuasão dos dirigentes do Flamengo. Campeão da Copa do Brasil em 2013, Paulo Pelaipe foi contratado para gerenciar o futebol e é muito próximo dos dois, especialmente de Marcos Braz, que o considera seu braço direito dentro do departamento de futebol.
BAP (vice de relações externas e comitê), Fábio Palmer (comitê), Dekko Roisman (comitê), Diogo Lemos (comitê), Bruno Spindel (diretor de futebol), Rodrigo Dunshee (vice geral e jurídico), Rodolfo Landim (presidente) e Marcos Braz (vice de futebol e comitê) — Foto: Reprodução
Entre luvas, comissões e aquisições de direitos econômicos, foram gastos quase R$ 140 milhões no primeiro semestre. Tudo de forma parcelada e dentro do orçamento. Além de fortalecer o time, a janela caseira enfraqueceu os adversários nacionais.
Mudança de comando no meio do caminho
Jorge Jesus e Marcos Braz. Aposta inusitada do vice de futebol revolucionou o ano do Flamengo — Foto: Alexandre Vidal / Flamengo
- Quando soubemos que ele ia ver o jogo contra o Atlético-MG, pensei: "Poxa, será que ele quer mesmo ir para o Brasil?". Fiz contato com uma pessoa e pedi uma reunião para conhecê-lo, avisei ao Bruno (Spindel) e conversamos. Dois dias depois, tivemos a surpresa do pedido de demissão do Abel. Como estávamos na Europa, intensificamos as coisas. O Landim viajou para a final da Champions e a coisa aconteceu – recordou Marcos Braz, responsável direto pela contratação de Jesus, em entrevista ao GloboEsporte.com
Jorge Jesus desembarcou no Rio de Janeiro com sete membros da comissão, implantou uma revolução no dia a dia do clube e o resto é história. O início até teve seus percalços, como a eliminação para o Athletico-PR na Copa do Brasil e a quase queda para o Emelec nas oitavas da Libertadores. A partir de agosto, no entanto, o Rubro-Negro deslanchou e arrancou para os títulos do Campeonato Brasileiro e da Libertadores.
Mochilão pela Europa
Bruno Spindel, Marcos Braz e Paulo Pelaipe na apresentação de Pablo Marí e Gerson. Trio comanda o dia a dia do futebol do Flamengo — Foto: Alexandre Vidal / Flamengo
Após uma janela caseira, o Flamengo foi ao exterior se reforçar no segundo semestre. As viagens de Marcos Braz e Bruno Spindel foram apelidadas de “mochilão”, por conta de uma declaração de Bap. Portugal, Itália, Espanha, França, Alemanha, Inglaterra e até Monaco fizeram parte do roteiro.
Ao todo, foram três viagens para o continente, que renderam contratações importantes, como Rafinha, Filipe Luis, Gerson e o até então desconhecido Pablo Marí. Todos tinham propostas para seguir na Europa, mas toparam o desafio de defender o Flamengo. O clube ainda tentou a contratação de Mario Balotelli como cereja do bolo, mas o Italiano optou por defender o Brescia.
Curiosidades
Gabigol, Bruno Henrique e Arrascaeta. Trio encantou o Brasil em 2019 — Foto: Divulgação
A contratação de Gabigol não era unanimidade na Gávea. Abel Braga preferia um 9 com características de centroavante e alguns membros da diretoria tinham dúvidas quanto ao jogador. Marcos Braz bateu o pé e conduziu a negociação. Foi uma aposta pessoal do vice de futebol.
Marcos Braz e Gabigol foram flagrados em dezembro passado, em um shopping da na Barra da Tijuca — Foto: Reprodução/
A negociação com Arrascaeta foi das mais complicadas, especialmente pela postura de Itair Machado, então diretor do Cruzeiro. Para acalmar os ânimos, foi decidido que as conversas seguiriam em um lugar neutro. São Paulo foi opção, mas a negociação teve seus capítulos finais em Montevidéu, na casa de um dos empresários do jogador. Bruno Spindel representou o Flamengo no Uruguai. De uma churrascaria no Rio de Janeiro, Marcos Braz ajustou detalhes por telefone com Itair Machado. Uma das condições para o acerto foi que o Flamengo retirasse a proposta por Dedé. O que de fato aconteceu.
O primeiro encontro entre Flamengo e Rafinha aconteceu na véspera do Réveillon, em um hotel em São Paulo. Marcos Braz, Rafinha e Lincoln (ex-jogador e empresário do lateral) ficaram horas reunidos. O jogador curtiu o projeto apresentado, mas a palavra final veio somente em maio, após ele decidir que de fato não seguiria na Europa.
A ideia de defender o Flamengo surgiu como uma brincadeira, em um papo informal entre Filipe Luis, seus empresários e Sávio. O projeto foi apresentado ao Flamengo, as conversas começaram em maio, mas certamente a negociação foi das mais arrastadas. Com propostas da Europa, Filipe pediu prazo até a Copa América, depois avisou que responderia somente após a competição e ainda levou mais duas semanas para bater o martelo. A demora incomodou diretoria e torcedores, mas a espera valeu à pena.
Pablo Marí e Gerson chegaram ao Brasil no mesmo voo, com procedência de Madri. Apostas que deram certo — Foto: Marcelo Cortes/Flamengo
Se muitas negociações se arrastaram, o acerto com Pablo Marí foi bem rápido. Após conversas com vários jogadores na Europa, como Jemerson, Zapata, Wallace, Bruno Viana, entre outros, o clube buscou a contratação do desconhecido espanhol por indicação de João de Deus, auxiliar de Jorge Jesus. O centro de inteligência de mercado fez o levantamento sobre o atleta, as conversas foram rápidas, e o Flamengo contratou Marí em poucos dias, após viagem de Bruno Spindel e Marcos Braz a Madri.
Alívio na folha e receita com vendas
Cuéllar, Flamengo — Foto: Jorge R Jorge/BP Filmes
As vendas também renderam um bom dinheiro. O clube arrecadou R$ 140 milhões com as negociações de Cuéllar (R$ 34 milhões), Léo Duarte (R$ 41 milhões), Jean Lucas (R$ 28 milhões), Truaco (R$ 10 milhões), Henrique Dourado (R$ 22 milhões) e Uribe (R$ 6 milhões).
Histórico de erros e acertos
Diego Alves, Éverton e Diego foram três acertos da antiga gestão. Goleiro, porém, estava afastado no fim do ano passado — Foto: Getty Images
O segundo mandato de Eduardo Bandeira, em janeiro de 2016, começou com a promessa de investimento e títulos no futebol. Com grana em caixa, o clube passou a investir em aquisições de direitos econômicos, com números mais modestos do que os atuais.
Desde então foram muitos jogadores contratos, com erros e acertos. É inegável que antigas contratações, como Everton Ribeiro – o maior acerto na antiga gestão -, Willian Arão, Diego Alves, Vitinho, Cuéllar e Diego foram importantes ao longo de 2019.
Contratado em 2015, Cirino custou cerca de R$ 19 milhões ao Flamengo e não vingou — Foto: André Durão
No ano passado, impulsionado pelas parcelas da venda de Vinicius Jr., o clube foi forte ao mercado e desembolsou mais de R$ 100 milhões em aquisições de direitos econômicos (veja a tabela acima), em nomes como Vitinho, Piris da Motta, Uribe e Piris da Motta. No caso do colombiano, apenas com pagamento de luvas e intermediários. Não houve o retorno esperado, e o Flamengo terminou a temporada sem títulos.
Contratado com pompa em 2017, Conca ficou um ano no Flamengo, jogou apenas 22 minutos e custou cerca de R$ 2,5 milhões com salários — Foto: Divulgação/Flamengo
Fonte: https://globoesporte.globo.com/futebol/times/flamengo/noticia/como-foi-formado-o-elenco-que-revolucionou-o-flamengo-e-conquistou-quase-tudo-em-2019.ghtml
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