Por Carlos Eduardo Mansur | GE: Não é possível dizer que, em futebol, resultados não importam. Joga-se por
eles, afinal de contas. Mas é curioso como o julgamento sobre personagens se
sujeita ao desfecho dos jogos, sejam eles encontros por fases classificatórias
de Estaduais ou partidas definidas por margens mínimas, como a Supercopa em
que o Atlético-MG derrotou o Flamengo após 24 cobranças de pênaltis. O olhar
sobre o rubro-negro Paulo Sousa é um exemplo de como, por vezes, a tentativa
de adaptar a narrativa aos placares nos faz perder o essencial.
Derrotado no Fla-Flu disputado há pouco mais de duas semanas, o português viu
suas constantes mexidas na equipe, método anunciado por ele ao início da
temporada, tornarem-se quase um folclore. Em seguida, o 2 a 2 de Cuiabá,
seguido pela interminável sequência de penalidades, foi tratado como um
clássico de alto nível. Mas mal o clássico com o Botafogo se aproximava e a
partida era tratada como uma "chance de recuperação", como uma "resposta",
como a oportunidade de enfim vencer um rival de peso. O Flamengo bateu com
certa sobra o alvinegro, sua atuação foi saudada como uma espécie de afirmação
do trabalho, mas o que se viu em campo nada mais era do que um processo em
evolução, uma etapa da construção de um time para a temporada. E,
provavelmente, uma virtude importante foi pouco notada.
É verdade que o Flamengo fluiu de forma notável com a bola, que encontrou
aproximações para tabelas curtas, que infiltrou pelo meio da defesa adversária
- algo cada vez mais difícil no jogo atual - e que alternou lances de
construção paciente, como no terceiro gol, com contragolpes rápidos como o do
lance convertido por Gabigol. No entanto, o que talvez mereça mais destaque é
o fato de o time ter feito tudo isso com uma escalação que trazia cinco
mudanças em relação ao jogo da Supercopa. Ainda é cedo demais para decretos e
vereditos, mas talvez este seja o dado mais promissor sobre o atual trabalho
da comissão técnica.
Encerrado o jogo, pouco se falou que meio time rubro-negro fora alterado em
relação à decisão de Cuiabá, jogo que, em tese, veria em campo a "formação
ideal" de Paulo Sousa. E, provavelmente, a raridade de tais comentários se deu
porque a naturalidade com que o time funcionou acabou por deixar a escolha do
onze em segundo plano. O Flamengo tem muitos talentos, mas a execução do
sistema, de uma ideia, começa a ser o centro do jogo. E a beneficiar as
individualidades. Talvez seja um sinal de um trabalho que busca fazer todo o
grupo compreender os mecanismos. Leva tempo, por vezes arrisca resultados, mas
é a opção por um caminho sem atalhos.
É impossível dizer, agora, o nível de sucesso que Paulo Sousa terá no
Flamengo. Há todo tipo de ponderações a fazer, do início do trabalho à
fragilidade do Botafogo. Mas os sinais recentes são bons, especialmente com
bola. Na hora de defender, o time ainda mostra pontos a progredir,
especialmente quando não consegue recuperar a bola no campo ofensivo. Os
espaços às costas dos volantes ainda surgem, e o Flamengo tem mais dificuldade
para proteger as imediações de sua área.
O jogo com Botafogo mostrou um time que respondeu bem às mudanças na
escalação. Uma delas, a entrada de Léo Pereira na vaga de Filipe Luís. Em
tese, o desenho mudou pouco: o Flamengo seguia iniciando a construção de
jogadas com três homens atrás, mas no lugar de um deles ser um lateral, eram
três zagueiros natos. Ao defender, Matheuzinho recompunha como lateral pela
direita. No entanto, foi mais comum ver Lázaro, o ala pela esquerda, retornar
até a última linha de defesa, como um quinto homem. Algo que já acontecera em
jogos do Estadual em que o Flamengo utilizou um zagueiro no lugar de Filipe
Luís.
No ataque, tem sido interessante ver Gabigol se adaptando a ser ora um "camisa
9" de mobilidade, ora um dos homens por trás do centroavante, no caso Pedro.
Ontem, ele e Arrascaeta foram bem ao acionar Pedro ou ao infiltrar na área em
diagonais que a permissiva defesa alvinegra teve dificuldade de marcar. Por
ora, tudo são sinais, sintomas. Só a sequência permitirá constatar se este
Flamengo terá consistência.
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Imagem: André Durão
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