Mestre da tática, folclórico, intenso e intratável: portugueses apresentam novo técnico do Flamengo



Os jogadores brasileiros que trabalharam que Jorge Jesus o encheram de elogios. "Indiscutível", "melhor", "exigente", “detalhista”, foram alguns adjetivos preferidos ao novo técnico do Flamengo. Na imprensa lusitana, no entanto, o sucesso do português no Brasil é uma incógnita. É consenso a paixão pelo futebol e o grande conhecimento tático do treinador, assim como sua controversa personalidade.



Conversamos com cinco jornalistas portugueses. Todos decretaram: Jorge Jesus é um excelente treinador, sabe tudo do campo e bola e gosta de montar times ofensivos. É obsessivo por tática e tenta tirar o melhor de cada jogador.

Sua personalidade, no entanto, é peculiar. Jorge Jesus é um “fenômeno de popularidade” em seu país. Não tem uma linguagem academia, tem uma forma única de falar e não mede palavras, doa a quem doer. É amado por muitos, mas odiado por alguns. Não foi coincidência o fato de a negociação com o Flamengo ter atraído tantos holofotes em seu país. A imprensa lusitana acompanhou o desenrolar do acerto como se um grande clube de Portugal estivesse envolvido.



João Almeida Moreira, correspondente do "A Bola" no Brasil
Jorge Jesus começou no Felgueiras, um time pequeno, e deixou um legado de qualidade. Depois foi para o Estrela Amadora e ganhou o apelido de "Cruijff da Reboleira", o bairro do clube. Foi nessa época que começou a conquistar a admiração de jornalistas e torcedores, até por ser um treinador ousado. Era um treinador com resultados, mas também se destacava pela personalidade de confrontos, um pouco tipo o Luxemburgo, com declarações fortes. Declarações que viraram uma espécie de marca.

Teve muito sucesso no Benfica. Mas teve um jeito muito intenso. Mesmo ganhando, acho que o presidente do Benfica, Luis Felipe Vieira, depois de um tempo, se cansou um pouco do jeito dele. Falou-se que ele iria para o exterior, mas acabou fazendo um movimento ousado, ao estilo Jorge Jesus, e foi para o Sporting, que é seu clube de coração. Em Portugal foi a mesma coisa de trocar o Flamengo pelo Vasco ou Fluminense. No Sporting, de maneira geral, foi um fracasso. Ele não ganhou o Campeonato Português, mas ganhou outras coisas.



Ele tem um pouco de Joel Santana, pelo lado folclórico e cômico, com Luxemburgo, por ter um ego enorme. Mas atenção! Esse lado folclórico não invalida o fato dele ser muito bom treinador, um cara vencedor. Acredito que o Flamengo jogue para frente, tente se impor. Ele é um cara que sabe muito de tática. É um ignorante especializado. Ignorante talvez seja uma palavra muito forte, mas é uma pessoa sem muita cultura, mas uma espécie de mestre da tática no futebol. Ele sempre gostou muito do futebol brasileiro. É daqueles que assiste Série A e Série B na madrugada de Portugal.

João Esteves, comentarista de A Bola TV
Jorge Jesus é a cara do Flamengo. Apaixonado pela sua profissão, ambicioso e obstinado, o treinador português escolhido para conduzir o clube da Gávea respira futebol e é um especialista tático que, desde muito jovem, se inspirou nos métodos de Johan Cruyff que conduziram ao “dream team” do Barcelona.



Exigente no trabalho, inovador nos métodos de treino que utiliza, explosivo na forma como vive cada segundo do jogo, Jorge Jesus nunca escondeu a admiração pelos jogadores e futebol brasileiro. É um consumidor compulsivo do jogo que se pratica nos gramados brasileiros e foi responsável pela explosão e afirmação de futebolistas que ajudou a promover à seleção canarinho. Não surpreende que antigos internacionais como David Luiz, Luisão, Ramires ou Júlio César o considerem como dos melhores e mais inovadores dos técnicos com quem trabalharam.

Sérgio Pereira, do "Mais Futebol"
Jorge Jesus é um estudioso do futebol. É um treinador que dá enorme importância às questões táticas e técnicas, mas falha um pouco nas mentais: sobretudo no relacionamento com os jogadores. Gosta do jogo ofensivo e geralmente muito atrativo para o público.



Não é um motivador, um psicólogo, mas consegue motivar os jogadores pelo fato de os colocar para jogar ao ataque e um futebol ambicioso. Em Portugal é uma lenda, um dos treinadores mais conceituados, depois de ter conseguido colocar o Benfica a ganhar títulos e a jogar finais europeias: numa altura em que o Benfica estava há praticamente vinte anos em crise, Jorge Jesus conseguiu reerguer o clube e torna-lo enorme outra vez. Acredito que pode fazer o mesmo no Flamengo, sobretudo se tiverem paciência com ele.

Tomás Cunha, da Eleven Sports
Obcecado por análises táticas. Sem predileção por esquemas defensivos ou ofensivos. Gosta de equipes equilibradas (4-4-2). Valoriza a posse de bola, mas se seus jogadores precisarem dar chutão, não vai se remoer no banco. Ele também valoriza a posse de bola, mas não é algo que seja de maior importância. Costuma exigir passes rápidos no último terço.



Jesus costuma valorizar um homem de referência no ataque, com apoio de mais um outro chegando por trás. Gosta também de usar as laterais para construção do ataque. Em algumas situações, se mostra satisfeito com o resultado. Guarda vantagem e não mexe muito. Ele é também muito inquieto no banco. Pode parecer um pouco teimoso. Quando gosta de um jogador, não costuma mudar muito os planos.

Ele não é de usar muitos jogadores. Pelo menos aqui, montava times com 13, 14 jogadores e mantinha isso até o fim. No vestiário, não é de dar abertura para muita aproximação. É mais antiquado nesse aspecto. E é bastante rígido.



Os treinos físicos são bastante exaustivos. Costuma levar a equipe ao limite tático. Não sei como vai ser isso no Brasil. Ele teve muito peso na construção do plantel do Benfica. Gosta de agir assim. No trato com a imprensa, às vezes é duro nas respostas. Ele foca muito no jogo. Não gosta de questionamentos de contratações, por exemplo.

Filipe Dias, jornal "O Jogo"
Jorge Jesus é uma figuraça do futebol português. Foi um meia ofensivo modesto, passou por Sporting, mas nunca chegou ao alto nível. Mas sempre foi obcecado pela parte tático, um jogador muito dedicado. Ele autodidata, sem um grau acadêmico, uma pessoa do campo. Ele não tem uma abordagem acadêmica das coisas. É alguém cujo conhecimento está baseado na prática. Sempre foi um treinador arrojado, um treinador que faz coisas diferentes, a ponto de ser intratável. Esse é o grande problema dele.



É uma pessoa de bom caráter, extremamente emotivo, mas chega a ser grosseiro no trato com os jogadores. Ele é detalhista e cobra isso dos jogadores. Ele tem uma maneira de se expressar muito própria.

É um treinador que conhece muito bem o futebol português e demorou a chegar a um grande clube. Mas quando chegou, logo conseguiu resultados expressivos no Benfica. É um treinador que desperta amor e ódio. Quem foi treinado por ele nunca esquece. É um caro bruto, que grita com os jogadores, mas depois eles o agradecem por tudo que ele os ensinou. Mas até por isso é um treinador que se desgasta rápido. Quem trabalha com ele, tem que fazer as coisas por antecipação e saber bem o que ele quer.

A experiência no Brasil é um desafio. Ele nunca foi o treinador da moda, mas se tornou um fenômeno de popularidade em Portugal. Estou muito curioso para ver como vão receber os métodos de Jesus no Brasil. Até porque o jogador brasileiro é muito técnico, mas sempre precisa de um tempo de adaptação tática quando chegar a Portugal.

* Fred Huber, Gabriela Moreira, Gustavo Rostein e Marcelo Baltar participaram dessa reportagem.


Fonte: https://globoesporte.globo.com/futebol/times/flamengo/noticia/mestre-da-tatica-folclorico-intenso-e-intratavel-portugueses-apresentam-novo-tecnico-do-flamengo.ghtml

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